Saneamento Básico, o filme (2007) de Jorge Furtado



Publicado em 2013

          Confesso desde já que há muito tinha enorme preconceito pelas produções nacionais, os clichês de sempre que não agradam a todos, eu sou um deles. O excesso em palavrões, drogas, tiros, favelas, palavrões, sexo, polícia, palavrões e sexo me faziam sempre ter dois pés atrás com relação aos filmes tupiniquins. Tínhamos até então "apenas" esses filmes e outros mais voltados ao público infantil ou "filmes para família" como os filmes genéricos de Xuxa e Didi da vida. Até há uns cinco anos, pelo menos, o único filme brasileiro que me agradava e pelo qual sou apaixonado eternamente era o irresistível O Auto da Compadecida. Mas isto vem mudando, tenho procurado mais, pois a Preguiça é a mãe de toda a Ignorância e tenho achado muitos outros filmes nacionais bem bacanas. O caso de hoje é Saneamento Básico, O Filme  (2007) de Jorge Furtado, o mesmo de A Ilha das Flores (1989).
          Tudo começa pela necessidade que a comunidade de Linha Cristal (cidade fictícia do Rio Grande do Sul) tem da construção de uma fossa para o tratamento de esgoto. Uma comissão é eleita para cuidar deste caso junto à sub-prefeitura, mas esta não disponibiliza a verba para tal obra. No entanto, dispõe de uma quantia de 10 mil reais para a realização de um filme - "um filme de ficção, com roteiro e tudo" - "que se não for usado voltará para Brasília". O filme gira a partir disso, da ideia que Marina (Fernanda Torres) e Joaquim (Wagner Moura) tem de produzir este filme e com o dinheiro recebido do concurso pagar os custos da obra.
          Ao assistir filme gostei de imediato da sua simplicidade. Uma história sem "loucuras" ou fatos mirabolantes, mas bastante comum, com um enredo envolvente justamente por seu apego à realidade. O que de fato é interessante neste filme são as suas entrelinhas mostradas na tela. Um filme que fala sobre um filme, que fala sobre cinema, um metafilme. Cabe lembrar que no primeiro momento as personagens não tinham interesse em fazer o tal filme, queriam apenas o dinheiro para a construção, o filme era um meio apenas. Com o desenrolar da trama eles se envolvem pouco a pouco em sua produção, ou melhor, deixam-se envolver por tudo aquilo que se traduz em fazer cinema. O filme ganha corpo e vai passando a ter prioridade, tornando-se digno até de alguns sacrifícios por parte de seus produtores para a sua realização. Um filme que conta a história de um monstro do fosso ( ou fossa) em uma cidadezinha do sul do Brasil, um curta-metragem de baixo orçamento que em si carrega esta loucura/coragem/aventura que é o fazer cinema para quem é apaixonado pela arte. Saneamento Básico, antes de tratar sobre aquilo que lhe confere o título, fala em última instância sobre a essência (se assim podemos chamar) do que é cinema, e da imersão de pessoas comuns nesta linguagem artística, seja por uma inicial necessidade, mas que se transforma em prazer e paixão.



          "Saneamento Básico, o filme" é levemente engraçado, é sútil, simples, mas também profundo. Ao meu ver é uma obra que enriquece o cinema brasileiro ao mostrar - ainda no plano micro - a realidade experimental que é a história inicial de grande parte dos que se atrevem a fazer cinema no país. Também serve para encorajar, ao fazer lembrar dos desafios, motivações e paixões pelo cinema que envolve a todos os quais enfrentam as dificuldades de ser um cineasta em terras brasileiras.

Nota: 3/5 

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