Análise de “Todo o dinheiro do mundo” (2018), de Ridley Scott
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Divulgação |
A avareza, a futilidade da
riqueza e miséria interior dos homens e mulheres ricos sempre foram temas
bastante abordados tanto na literatura como no cinema. No entanto, a forma pela
qual são trazidos aos seus espectadores sempre varia. Não tão amável ou
redentivo como “O Conto de Natal” de Dickens, o
filme traz como tema principal a mediocridade do amor à riqueza e o grande
custo exigido de quem deseja conquistá-la, ou ainda pior, para mantê-la. Nas palavras
de um de seus personagens centrais, J. Paul Getty (Christopher Plummer): “Tudo
tem um preço. A grande dificuldade da vida é o esforço para entender qual é
esse preço”.
Devo confessar, antes de mais
nada, que minha chegada a “Todo o dinheiro do mundo” se deu, sobretudo a enorme
polêmica gerada no período de produção da película, causada principalmente
pelas acusações de assédio contra Kevin Spacey, escalado para
o papel de J. Paul Getty (como chega a aparecer no primeiro trailer do filme,
que você confere aqui) sendo substituído um mês antes do término da produção por
Plummer em uma tentativa de não comprometer o filmes, e, principalmente, a recepção do filme junto ao público e a crítica. Ao
ler as notícias na época, impressionei-me com a rapidez da substituição do nome de
Spacey na produção para colocarem Plummer em seu lugar, sem que isto comprometesse
o prazo de conclusão do projeto, não causasse erros de continuidade do roteiro
assinado por David Scarpa, e não desse prejuízos monetários.
“Todo o dinheiro do mundo” conta
a história de um evento particular na vida de John Paul Getty III (Charlie
Plummer). Neto do “homem mais rico que já existiu” (e apesar do sobrenome, não é neto de Christopher
Plummer na vida real), tem sua vida devastada quando é sequestrado na cidade de
Roma, em 1973. O preço do resgate? Dezessete milhões de dólares. O que parecia
não ser problema algum para um bem-sucedido magnata do petróleo (mas que
lavava a própria roupa no banheiro de hotéis para não gastar dinheiro com serviço de quarto) mostra-se como o ponto de partida de toda a tensão e conflito do
filme, quando este se nega a pagar o resgate, pois tal “era muito dinheiro para
um rapaz tão jovem” e que, tendo 14 netos, "se começasse a pagar resgates, teria 14 netos sequestrados".
Assim, o drama segue nos dilemas enfrentados
pela mãe do garoto, Gail Harris (Michelle Williams), na luta da libertação do filho
das mãos de seus sequestradores, e na luta pessoal junto ao ex-sogro, de modo a conseguir que Getty conceda o valor
do resgate, custe o que custar.

Apesar da tentativa do roteiro em
focar a trama na impotência de Gail diante do pagamento do resgate do filho, a
atuação de Williams (mesmo sendo indicada ao Globo de Ouro neste papel) não convence. Tem
pouca ou quase nula expressividade, chegando a ser mecânica, se considerarmos
outras protagonistas de filmes com temática semelhante, como a própria Angelina
Jolie em “A Troca”. Ainda que tal construção da personagem fosse pensada desta
forma, como alguns dizem, para demonstrar a força e dureza da personagem diante
do caos, isso fica incoerente com pequenas cenas que são salpicadas ao redor do
filme que mostram um lado afetuoso ou mesmo irônico da mesma.
As regravações das cenas do filme são uma possibilidade de explicação disto, mas não em sua totalidade. As excessivas informações (desnecessárias muitas vezes) no decurso do drama, talvez para dar uma veracidade histórica ao filme “baseado em fatos reais”, especialmente para demonstrar o modo de vida do bilionário Getty acabam por deixar a proposta inicial (o sequestro do Getty III) em segundo plano.
Um pouco mais confuso que isso, ainda no roteiro, são algumas cenas de construção de outros personagens, como a do faz-tudo de Getty o “ex-espião” Fletcher Chace (Mark Wahlberg com atuação semelhante a de Williams) ao ficar tomando conta dos filhos de Gail em sua casa, ou o suposto romance que se ensaia entre eles.
As regravações das cenas do filme são uma possibilidade de explicação disto, mas não em sua totalidade. As excessivas informações (desnecessárias muitas vezes) no decurso do drama, talvez para dar uma veracidade histórica ao filme “baseado em fatos reais”, especialmente para demonstrar o modo de vida do bilionário Getty acabam por deixar a proposta inicial (o sequestro do Getty III) em segundo plano.
Um pouco mais confuso que isso, ainda no roteiro, são algumas cenas de construção de outros personagens, como a do faz-tudo de Getty o “ex-espião” Fletcher Chace (Mark Wahlberg com atuação semelhante a de Williams) ao ficar tomando conta dos filhos de Gail em sua casa, ou o suposto romance que se ensaia entre eles.
Deste modo, “Todo o dinheiro do
mundo” torna-se um filme sobre J. Paul Getty e sobre a atuação brilhante de
Christopher Plummer (ganhador do Óscar por Toda forma de amor) que consegue passar a dramaticidade e a profundidade de seu
personagem para além de apenas “um velho rico e avarento”. O apego de Getty
pelos objetos, especialmente as Belas-Artes, revela uma carga psicológica muito
maior do que o colecionismo como demonstração de riqueza por si só. O magnata,
como é revelado logo no início do filme, que largou a família para dedicar-se
aos negócios vive durante o filme a frustração de não conseguir aquilo que na velhice almeja e não possui. As coisas – sejam elas pinturas,
esculturas ou o dinheiro – são apenas frágeis substitutos, que representam tudo
aquilo que Getty gostaria para a sua família, quando diz: “É por isso que eu gosto
de coisas, entende? Objetos, artefatos, pinturas. Elas são exatamente o que
parecem ser. Elas nunca mudam e elas nunca decepcionam. Existe uma pureza nas
coisas bonitas que eu nunca fui capaz de encontrar em qualquer ser humano”. Em síntese,
o controle das pessoas, tal qual como das coisas as quais Getty sempre possuiu.
Por último, destaco as atuações de Charlie
Plummer e do ator italiano Romain Duris, respectivamente, J. Paul Getty III e o
“bom” sequestrador Cinquanta ao contribuir bastante para a qualidade das cenas
no cativeiro que são por vezes monótonas, mas ganham contornos expressivos em
momentos certos com a relação de ambos os personagens, como na cena do corte da
orelha, acentuando assim o suspense do filme.
Ficha técnica
Todo o Dinheiro do Mundo (All the Money in the World). EUA, 17. Direção de Ridley Scott. 2h12 min. Roteiro de David Scarpa baseado em livro de John Pearson. Com Michelle Williams, Christopher Plummer, Mark Wahlberg, Romain Duris, Timothy Hutton, Charlie Plummer, Marco Leonardi, Andrew Buchan, Giuseppe Bonifati. Sony.
Frase síntese
“Tudo tem um preço. A grande batalha da vida é manipular todos esses preços”.
Nota 3/5(Recomendo)
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